blog que trabalha com teorias estéticas, filosofia e filosofia da arte. procura abordar signos do nosso dia a dia e como a arte é inserida no popular.
quinta-feira, 3 de setembro de 2009
Escrito por João Werner, publicado na Folha de Londrina, Caderno 2, 03/02/1990, pp. 17
"A estética de Max Bense"
Dia 7 de fevereiro é data de aniversário de Max Bense, um dos fundadores da moderna estética informacional.
A inteligência, em sua exercitação, é um processo de natureza subversiva. Em campos inimaginados de indagação encontra alento, questionando preconceitos, derrubando fronteiras, faz luz e é frutífera no âmbito da cultura. Na arte - campo de especulação tradicional de um conteudismo estéril - muitas vezes, na história, foi negado que houvesse qualquer laço de fato entre os processos sensíveis típicos da arte e a inteligência crítica.
Tão grande, na realidade é este preconceito que a mera sugestão de associar-se à estética alguns princípios matemáticos, causa achaques em muita gente. Este é, no entanto, justamente o principal legado intelectual que o filósofo da estética e crítico Max Bense deixou à arte.
Nascido em Estrasburgo, na Alemanha, Bense, depois de ter sido professor na Escola Superior da Forma de Ulm, ocupou a cadeira de Filosofia da Escola Politécnica de sua cidade natal. Além de filósofo, Bense era artista e escritor. Deixou sua obra filosófica composta de vários livros importantes, entre os quais o clássico Aesthetica, publicado entre 1954 e 1965, e Semiotische Prozesse und Systeme, de 1975.
Dentre as inúmeras influências que sua estética exerceu, cabe destacar o profundo intercâmbio que Bense manteve com artistas e intelectuais brasileiros. Todo o movimento concretista, na poesia ou nas artes plásticas recebeu o impacto direto de suas idéias. O grupo de poesia concreta brasileiro noigandres, composto, entre outros, por Augusto de Campos, Décio Pignatari e Haroldo de Campos, manteve estreitos laços de amizade com Bense. Artistas plásticos como Lygia Clark e Mira Schendel tiveram suas obras comentadas pelo filósofo alemão.
Decorrência destes inúmeros laços intelectuais, foram as exposições realizadas na Alemanha por artistas brasileiros. Várias mostras de poesia concreta - como a realizada no Technische Hochschule de Stuttgart, em 1959 - bem como exposições de artes plásticas - como a realizada por Lygia Clark, em 1964, na mesma cidade - foram organizadas.
Bense sentia profunda identificação pela cultura brasileira, a ponto de intitular um de seus ensaios de New Canibalism, numa clara referência à Semana de 22.
A estética bensiana não é uma filosofia do gosto no sentido clássico, nem tampouco pretende ser o método de análise crítica da arte. Propõe-se, sim, como um sistema aberto de experienciação, sujeito à verificabilidade de suas explicações parciais: sujeito, enfim, à refutação e aprimoramento da utilização de seu instrumental de ajuizamento.
Bense pensa a arte, portanto, a partir de um postulado racionalista - à maneira de Popper - supondo que, concomitante a todos os processos sensíveis e emocionais da obra de arte, é possível, através de argumemtação sobre dados materiais mínimos, chegar a explicações convincentes sobre o fenômeno artístico.
Esses dados mínimos compõem a materialidade da obra - objeto da cultura - visto enquanto suporte físico - cores formas, linhas etc. - e enquanto um sistema de signos referente a este sistema físico. Para avaliação da invenção na obra de arte, a estética bensiana utiliza-se de pressupostos conceituais e metodológicos da teoria da informação e da semiótica modernas.
Uma das polêmicas mais acirradas provocadas por Bense, na Alemanha, foi uma apresentação sua na televisão local, realizando uma apreciação estatística de três pinturas de Rembrandt. Submetidas a um processo de mensuração por retícula, foram extraídas das obras o grau de distribuição do claro e escuro para o cálculo matemático da entropia. Despertou, é claro, a mais alta e estimulante polêmica.
Este modo de encarar a arte tem encontrado ferrenhos opositores. No entanto, basicamente a posição de encontrar um pressuposto racionalista para arte também tem estimulado os pesquisadores. A Unicamp, uma das mais conceituadas universidades do país, recentemente instituiu, como base de pesquisa em seus cursos de pós-graduação em arte, a tentativa de uma união entre a arte e a ciência.
Ao afirmar - em entrevista concedida a Haroldo de Campos - "o problema está em saber se as artes e a poesia saberão encontrar métodos intelectuais ou maquinais para a realização de estados estéticos originais e inovadores. Trata-se de alcançar uma nova forma de fantasia racional" Max Bense se colocava como um dos precursores desta tendência atual de compreensão do fenômeno artístico.
Dados da publicação
Escrito por João Werner, publicado na Folha de Londrina, Caderno 2, 03/02/1990, pp. 17
Dia 7 de fevereiro é data de aniversário de Max Bense, um dos fundadores da moderna estética informacional.
A inteligência, em sua exercitação, é um processo de natureza subversiva. Em campos inimaginados de indagação encontra alento, questionando preconceitos, derrubando fronteiras, faz luz e é frutífera no âmbito da cultura. Na arte - campo de especulação tradicional de um conteudismo estéril - muitas vezes, na história, foi negado que houvesse qualquer laço de fato entre os processos sensíveis típicos da arte e a inteligência crítica.
Tão grande, na realidade é este preconceito que a mera sugestão de associar-se à estética alguns princípios matemáticos, causa achaques em muita gente. Este é, no entanto, justamente o principal legado intelectual que o filósofo da estética e crítico Max Bense deixou à arte.
Nascido em Estrasburgo, na Alemanha, Bense, depois de ter sido professor na Escola Superior da Forma de Ulm, ocupou a cadeira de Filosofia da Escola Politécnica de sua cidade natal. Além de filósofo, Bense era artista e escritor. Deixou sua obra filosófica composta de vários livros importantes, entre os quais o clássico Aesthetica, publicado entre 1954 e 1965, e Semiotische Prozesse und Systeme, de 1975.
Dentre as inúmeras influências que sua estética exerceu, cabe destacar o profundo intercâmbio que Bense manteve com artistas e intelectuais brasileiros. Todo o movimento concretista, na poesia ou nas artes plásticas recebeu o impacto direto de suas idéias. O grupo de poesia concreta brasileiro noigandres, composto, entre outros, por Augusto de Campos, Décio Pignatari e Haroldo de Campos, manteve estreitos laços de amizade com Bense. Artistas plásticos como Lygia Clark e Mira Schendel tiveram suas obras comentadas pelo filósofo alemão.
Decorrência destes inúmeros laços intelectuais, foram as exposições realizadas na Alemanha por artistas brasileiros. Várias mostras de poesia concreta - como a realizada no Technische Hochschule de Stuttgart, em 1959 - bem como exposições de artes plásticas - como a realizada por Lygia Clark, em 1964, na mesma cidade - foram organizadas.
Bense sentia profunda identificação pela cultura brasileira, a ponto de intitular um de seus ensaios de New Canibalism, numa clara referência à Semana de 22.
A estética bensiana não é uma filosofia do gosto no sentido clássico, nem tampouco pretende ser o método de análise crítica da arte. Propõe-se, sim, como um sistema aberto de experienciação, sujeito à verificabilidade de suas explicações parciais: sujeito, enfim, à refutação e aprimoramento da utilização de seu instrumental de ajuizamento.
Bense pensa a arte, portanto, a partir de um postulado racionalista - à maneira de Popper - supondo que, concomitante a todos os processos sensíveis e emocionais da obra de arte, é possível, através de argumemtação sobre dados materiais mínimos, chegar a explicações convincentes sobre o fenômeno artístico.
Esses dados mínimos compõem a materialidade da obra - objeto da cultura - visto enquanto suporte físico - cores formas, linhas etc. - e enquanto um sistema de signos referente a este sistema físico. Para avaliação da invenção na obra de arte, a estética bensiana utiliza-se de pressupostos conceituais e metodológicos da teoria da informação e da semiótica modernas.
Uma das polêmicas mais acirradas provocadas por Bense, na Alemanha, foi uma apresentação sua na televisão local, realizando uma apreciação estatística de três pinturas de Rembrandt. Submetidas a um processo de mensuração por retícula, foram extraídas das obras o grau de distribuição do claro e escuro para o cálculo matemático da entropia. Despertou, é claro, a mais alta e estimulante polêmica.
Este modo de encarar a arte tem encontrado ferrenhos opositores. No entanto, basicamente a posição de encontrar um pressuposto racionalista para arte também tem estimulado os pesquisadores. A Unicamp, uma das mais conceituadas universidades do país, recentemente instituiu, como base de pesquisa em seus cursos de pós-graduação em arte, a tentativa de uma união entre a arte e a ciência.
Ao afirmar - em entrevista concedida a Haroldo de Campos - "o problema está em saber se as artes e a poesia saberão encontrar métodos intelectuais ou maquinais para a realização de estados estéticos originais e inovadores. Trata-se de alcançar uma nova forma de fantasia racional" Max Bense se colocava como um dos precursores desta tendência atual de compreensão do fenômeno artístico.
Dados da publicação
Escrito por João Werner, publicado na Folha de Londrina, Caderno 2, 03/02/1990, pp. 17
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